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Rua Pe. Martinho Pinto da Rocha São Tomé, São Tomé e Príncipe

23º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO B

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Is 35, 4-7a; Tg 2, 1-5; Mc 7, 31-37

Faz que os surdos oiçam e que os mudos falem

 

O Evangelho de hoje nos fala de milagre realizado por Jesus, a realização de uma das profecias de Isaías: “… os ouvidos dos surdos se abrirão … a língua dos mudos cantará de alegria …” (Is 35,5.6).  E o evangelista Marcos nos relata isto em poucas palavras, curtas e simples, por isso, podemos correr o risco de não saber qual era a condição deste homem antes de encontrar Jesus: “Trouxeram-lhe um surdo que mal podia falar…”.

O homem era um surdo-mudo: não conseguia comunicar-se com os outros, antes de escutá-los, a menos que ouvisse as suas vozes, e expressasse os seus sentimentos e necessidades.  Os surdos não têm possibilidade de saber, compreender, apreciar, e a menos ouvir todo o mundo de sons e ruídos que nos rodeia continuamente.

Irmãos e irmãs, caríssimos, às vezes parecemos muito com os surdo-mudos, especialmente quando estamos no pecado.  Somos surdos, para dar alguns exemplos, quando não ouvimos e escutamos o grito de socorro que se eleva na nossa direção e preferimos colocar o “vidro blindado” da indiferença entre nós e o nosso próximo. Os pais são surdos quando não entendem que certas atitudes estranhas ou desordenadas dos filhos escondem um pedido de atenção e amor.  O marido se torna surdo, e até mudo, quando não consegue se aperceber do nervosismo da esposa o sinal de cansaço ou a necessidade de esclarecimentos.  E vice-versa para a esposa.  Ficamos mudos quando nos fechamos por orgulho num silêncio desdenhoso e ressentido, enquanto, talvez, com apenas uma destas simples palavras, como disse o Papa Francisco, de “‘com licença’, ‘obrigado’, ‘desculpa’” (Audiência Geral, 13.05.15), – acrescentaria o “perdão” –, poderíamos trazer paz e serenidade de volta para casa.

Curiosamente, a Bíblia nos faz entender de onde começou a crise da comunicação, de onde vem a nossa dificuldade em nos relacionarmos de maneira saudável e sublime.  Saibais disto, caríssimos irmãos: enquanto Adão e Eva estavam em boas relações com Deus, a sua relação recíproca também era linda e fascinante: “Esta … é carne da minha carne …” (Gn 2, 23). Apenas se interromperam as relações com Deus, por desobediência, começam as acusações mútuas: já não é “carne da minha carne”, mas sim, “a mulher que me deste por companheira, foi ela…” (que distanciamento!), “a serpente enganou-me …” (Gn 3,12-13), enfim, “foi ela”, “foi a serpente …” … e daí, no ar, pairou o silêncio.

Caríssimos, Jesus também veio para isso, Ele quer nos libertar, nós homens e mulheres aprisionados no silêncio.  Mesmo que nos resignemos e resistamos a ficar ali, o que decide a qualidade do nosso silêncio ou não, no entanto, não é simplesmente não falar ou não falar, mas sim, não falar ou falar por amor. E disto, me vem a propósito na mente, o Santo Agostinho que, num dos seus escritos exegéticos, refletindo sobre a impossibilidade de saber em cada circunstância qual é a coisa certa a fazer, se é oportuno falar ou se calar, corrigir ou deixar andar, afirma o seguinte: “de uma vez por todas, portanto, um breve preceito se impõe a ti: ama e faz o que quiseres! Se calares, calarás com amor; se gritares, gritarás com amor; se corrigires, corrigirás com amor; se perdoares, perdoarás com amor. Se tiveres o amor enraizado em ti, nenhuma coisa senão o amor serão os teus frutos” (Homilias sobre a 1ª Epístola de João).

É a partir daqui que devemos recomeçar todas as vezes.  Jesus veio para nos reconciliar com Deus e assim nos fazer reconciliar uns com os outros (cf. Cl 1,19-23).  Isso é feito principalmente por meio dos sacramentos.  A Igreja sempre viu, nos gestos aparentemente estranhos que Ele realiza sobre os surdos-mudos (coloca os dedos nos ouvidos e toca a língua), um símbolo dos sacramentos graças aos quais continua a nos “tocar” fisicamente para nos curar espiritualmente.  Por isso, no batismo, o ministro realiza os mesmos gestos sobre o batizando: põe o dedo nos ouvidos e toca a ponta da língua, repetindo a palavra de Jesus: “‘Efatá’, que quer dizer ‘abre-te’”!  Abre-te para o mundo, abre-te dos teus fechamentos, liberte a beleza e o potencial que estão em ti.  Abre-te para Deus e para os outros, mesmo com as tuas feridas…

E o Evangelho nos diz: “Imediatamente se abriram os ouvidos do homem, soltou-se-lhe a prisão da língua e começou a falar corretamente”.  Primeiro lhe se abriram os ouvidos – símbolo eloquente.  Na verdade, sabe falar somente quem sabe escutar, ao contrário dos outros que levantam barreiras quando falam – somente eles sabem e mais ninguém! –, se achando que os outros lhe estejam escutando.

Pois é! Peçamos, por isso, ao Senhor que, fazendo-nos tomar consciência da nossa surdez, abra os nossos ouvidos, todos os dias, para que possamos acolher a sua Palavra de vida com o coração renovado, mesmo quando esta for incómoda para nós.

Boa meditação, caríssimos e “uwã santù djàgingù da tudu nancê”. JB