«NÃO TENHAIS MEDO!» (Mt 14, 27), «DEUS É POR NÓS!» (Rm 8, 32).
Prudência, Solidariedade e Esperança
NOTA PASTORAL EM TEMPO DA COVID-19
Amados irmãos e irmãs,
A paz esteja convosco!
Os Bispos de Angola e São Tomé e Príncipe acabam de publicar uma Nota Pastoral sobre a situação que se vive nos nossos países, devido à pandemia do COVID-19. Faço um resumo da mesma, tendo em conta a nossa realidade específica.
- Angola e São Tomé e Príncipe, como tantos outros países no mundo, vivem, hoje, em Estado de Emergência, decretado pelas competentes autoridades nacionais, devido à pandemia da COVID-19: uma doença extremamente contagiosa, mortífera, que se expande rapidamente, com milhões de infectados no mundo, centenas de milhar de mortos e, para já, sem horizonte temporal em relação à sua duração nem em relação a soluções médicas eficazes.
- É um Estado de Emergência necessário, imprescindível e urgente, com todas as suas vigentes medidas de prevenção e que tem provocado muitos constrangimentos na vida social e eclesial. Paralisou, em grande medida, a vida em vários domínios: no convívio social, trabalho e produtividade com o fechamento de escolas de todos os níveis; mercado informal, de que vive a maioria da população, fortemente afectado; pobreza e fome que se agravam, de dia para dia; agravamento de outras doenças endémicas já presentes na sociedade antes desta nova e imprevisível doença; violência que cresce. Tudo isto traz incerteza, dúvidas e perturbações em relação ao futuro.
- A nível da pastoral da Igreja destacamos, particularmente, duas das mais graves consequências do isolamento social: a suspensão das celebrações dos sacramentos em geral, com destaque para a celebração da Eucaristia com a presença física dos fiéis, e a suspensão da catequese e de outras actividades pastorais dos vários grupos de apostolado.
- «Nós sabemos que Deus concorre em tudo para o bem dos que O amam» (Rm 8, 28). Felizmente, à luz da nossa fé, não vemos apenas coisas negativas nos acontecimentos históricos mas, nos sinais dos tempos, vemos Deus, o Senhor da história, a agir. Foram precisos planos de contingência e de emergência a nível mundial para fazer face a este flagelo global. Mesmo as nações mais fortes desde o ponto de vista do poder científico-técnico e económico-financeiro, que pensavam que estariam, porventura, imunes a qualquer epidemia, não estão a ser poupadas. Podemos dizer que o vírus abateu as barreiras geográficas, as condições sociais, económicas, hierárquicas com ricos e pobres, grandes e pequenos, letrados ou iletrados, a serem igualmente atingidos, ninguém goza de imunidade. Este acontecimento obrigou-nos a sentirmo-nos como parte de uma humanidade comum, na fragilidade. Oxalá pudéssemos sê-lo na fraternidade e na solidariedade.
- Tendo presente as actualizações constantes sobre o evoluir da doença, aumenta o nosso receio perante a precariedade das condições de vida da população. Serão as unidades sanitárias existentes e os meios mobilizados capazes de responder com a eficiência desejada à situação? Será possível garantir o sucesso da quarentena domiciliar tendo em conta a precariedade das nossas habitações/casas, com um elevado número de pessoas por família? Pode-se conseguir um confinamento eficiente quando a maioria das pessoas vive em situação de pobreza, com necessidade de procurar no dia a dia a sua subsistência?
- Preocupa-nos também:
. a falta de colaboração com as autoridades sanitárias no cumprimento das medidas de prevenção, por parte de vários cidadãos;
. a desobediência às normas estabelecidas;
. a entrada na época da gravana, um tempo mais frio e mais propício às gripes, como bem sabemos;
. o poder acontecer o uso e abuso desproporcional da força, por parte de alguns agentes de defesa, bem como as agressões a que os mesmos estão sujeitos, no exercício do cumprimento da sua missão de proteger a vida das populações;
. o eventual aproveitamento político e económico desta pandemia;
. os eventuais desvios de bens essenciais, equipamentos de biossegurança, medicamentos, por parte de gente sem escrúpulos;
. o perigo de discriminação de pessoas na distribuição de bens da cesta básica às famílias e pessoas mais vulneráveis;
. os falsos profetas e os charlatães de ocasião, que vendem curas fáceis e se aproveitam da ignorância ou negligência de muitos em relação ao perigo real que representa o COVID-19. Que as autoridades competentes estejam atentas e punam os prevaricadores.
- Perante este quadro cheio de sombras, mas também com alguns sinais de esperança, caso se respeitem as medidas apontadas pelas autoridades sanitárias, apelamos para um compromisso de todos na luta contra esta pandemia e de solidariedade empenhada para com os mais necessitados.
- Aos sacerdotes e consagrados em geral recomendamos:
. não abdiqueis das vossas responsabilidades pastorais, animando a pastoral caritativa e os valores evangélicos da solidariedade, da compaixão, da preocupação pela vida própria e alheia, vendo em cada pobre e necessitado o próprio Jesus que, continuamente, nos recorda ser feito a Ele o que fizermos aos nossos irmãos mais pequeninos (cf. Mt 25, 40).
. aproveitai este momento para explorar, com criatividade, novas formas de evangelização e de animação pastoral. O confinamento social oferece-nos imensas possibilidades de viver de forma nova o ministério sacerdotal e a missão da vida consagrada na Igreja.
. não descureis a oração, como meio fundamental de alimento da nossa fé e de solidariedade com todos aqueles que sofrem, rezando ao Senhor da Vida que nos liberte desta pandemia.
- Às famílias cristãs, e não só, recordamos:
. sois igrejas domésticas, lugares da prática das virtudes cristãs, com uma responsabilidade particular de atenção à protecção dos vossos filhos.
. fazei do vosso lar um espaço privilegiado de oração, de meditação da Palavra de Deus e do ensinamento da Igreja, traduzidos na salvaguarda da comunhão e unidade familiares e prática da caridade.
. esta situação pode transformar-se num tempo privilegiado da descoberta de dons e qualidades que nunca imaginastes existirem em certos membros da vossa família.
. procedei em tudo como pessoas chamadas a ser portadoras daquela esperança que não desilude, porque não engana.
. descobri o valor e a força da comunhão espiritual, nestas circunstâncias especiais em que não podeis participar fisicamente na Eucaristia.
. o isolamento social vos ajude a melhor descobrir e valorizar a família cristã, como uma instituição fundamental, onde somos acolhidos e amados incondicionalmente. Mesmo reconhecendo, infelizmente, a existência de alguns episódios de violência doméstica, os crentes estão a experimentar o valor da família como lar e verdadeira Igreja doméstica. Damos graças a Deus pelo dom das famílias e rezamos para que sejam cada vez mais escolas de fé e de vida.
- Uma palavra de reconhecimento e encorajamento às autoridades governamentais, com destaque para as autoridades sanitárias dos nossos países. Encorajamo-las a socorrerem a todos indistintamente, sem outros fins que não sejam o bem e a saúde pública dos cidadãos buscando soluções sociais e económicas com patriotismo, clarividência, espírito de solidariedade e sentido de Estado.
- Rezamos, igualmente, pelos médicos, enfermeiros, agentes de saúde, forças de segurança, voluntários que, neste período de emergência, estão na vanguarda, arriscando a própria vida para salvar outras vidas. Pedimos que vos distingais pela atenção a cada doente, independentemente da sua condição social e da situação clínica que apresente. Que o Senhor acompanhe a vossa fadiga heróica e vos dê força, bondade e saúde.
- Rezamos ainda por vós, jornalistas dos vários órgãos de comunicação social que, na presente situação de pandemia, tendes o dever de informar, sensibilizar, educar e chamar a atenção para as várias situações que clamam por socorro, alertando a quem de direito para que encontre as devidas soluções para os problemas que se apresentam.
- Estamos no Tempo Pascal, tempo da vitória definitiva da vida sobre a morte, tempo propício para o reforço da nossa fé e confiança em Deus, certos de que o amor de Deus é mais forte que a doença e a morte e far-nos-á sair vencedores de qualquer mal que nos possa atingir.
- A situação da pandemia, que estamos a viver, converta-se em oportunidade para darmos razão da nossa esperança e da diferença que um cristão deve fazer, especialmente, nos momentos mais difíceis da história humana. Vivamos em espírito de solidariedade e fraternidade a nossa proximidade a tantas situações de pobreza e mesmo de miséria, agravadas pelo Estado de Emergência. Participemos activamente nas campanhas de solidariedade; colaboremos na recolha e distribuição de víveres e da contribuição financeira a levar às famílias mais carenciadas em todo o território nacional. Cuidando cada um de si, dos seus, dos vizinhos, estará a cuidar e a proteger a inteira humanidade. A responsabilidade nesta luta é de todos, cada um segundo a sua condição e os meios de que dispõe.
- Neste tempo de provação que o Senhor nos concede, encorajamos a firmeza na fé, a conversão profunda do coração, a constância na oração pessoal e em família, destacando as orações de súplicas acompanhadas de práticas de penitência, certos de que a oração tem um poder muito grande pois, segundo a promessa de Jesus, tudo o que pedirmos ao Pai em Seu nome, não nos será negado. Exortamos também à perseverança no serviço, feito sempre com amor e dedicação. Peçamos a Deus, nosso Pai, com confiança filial, o fim desta terrível pandemia, para que a vida possa retomar, com serenidade, o seu curso normal.
- Deus é por nós (cf. Rm 8, 31). «Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, a angústia, a perseguição, a fome, a nudez, o perigo ou a espada? Mas, em tudo isto, somos nós mais que vencedores por Aquele que nos amou» (Rm 8, 35.37). Que nada nem ninguém nos separe do amor de Cristo (cf. Rm 8, 35)!
- Nesta hora de provação, confiamos e recomendamos os nossos países e suas populações à poderosa intercessão de Maria, Mãe da Igreja, Consoladora dos aflitos e Saúde dos enfermos.
22 de Maio de 2020
Com os bispos da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé
+ Manuel António Mendes dos Santos, cmf
Bispo de São Tomé e Príncipe