Mc 10, 28-31
“… nós deixámos tudo para Te seguir”.
O rico que queria seguir Jesus, mas refez os seus passos, semeia o pânico entre os discípulos; bem como o dura sentença do Mestre sobre os bens da terra – “é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus!” (Mc 10,25).
Na verdade, um coração cheio de presunção e obcecado pelos bens materiais, não poderá dar lugar ao absoluto de Deus e voar alto, mas se alimentará do vazio e da tristeza – “ele ficou pesaroso e foi embora cheio de tristeza, pois possuía muitos bens” (Mc 10,22).
Daí a razão que Pedro, no meio da perplexidade, eleva a sua voz, enquanto busca para si e para os restantes discípulos “seguro de vida”, e diz: “nós deixámos tudo para Te seguir”.
O pedido de Pedro parece fora do lugar. Não lhe basta o privilégio de ser, entre muitas pessoas, um “amigo íntimo” de Jesus, por isso tenciona negociar com Deus, e isso não é digno de um discípulo.
Portanto, a resposta de Jesus não se fez tardar: em troca “receberá cem vezes mais”. Estar com Ele é deixar tudo para ter o Tudo. Torna necessária uma grande renúncia. De facto, o teólogo Martinho Lutero (1483-1546), comentando essa passagem num sermão de 1517, disse: “sem a renúncia das coisas, nada se consegue diante de Deus”.
Aos privilégios, Jesus une “algumas renúncias”, sobretudo as que nos impedem de dar primazia a Deus nas nossas vidas, que são “casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos ou terras”, em suma, afectos e coisas. E daí, não obstante as efémeras “perseguições”, as alegrias são imensas: “receberá cem vezes mais… e a vida eterna”.
A vida de quem empreende este caminho, portanto, é repleta de rostos: cem irmãos, cem irmãs, cem mães e cem filhos, portanto, pertencerá a grande família de Deus. O desapego dos bens materiais nos livra de pesos desnecessários.
A propósito, dizia S. Filipe Néri, conhecido também como o Apóstolo de Roma e o Santo da Alegria (1515-1595): “abandonai-vos a Deus, abandonai-vos a Deus, e saibais que se Ele quiser algo de vós, Ele fará com que sereis bons em tudo o que Ele quiser de vós”.
O fator decisivo, portanto, é “abandonarmo-nos nas mãos de Deus” e colocar Deus no centro e em primeiro lugar nas nossas vidas. Assim, haverá a leveza necessária para dar mente e coração a Jesus. Que Ele infunda em nós em nós o seu amor, para que, amando-Lo em tudo e acima de tudo, alcancemos as suas promessas, que excedem todo o nosso desejo.
Boa meditação, caríssimos. JB