Jer 23, 1-6; Ef 2, 13-18; Mc 6, 30-34
“… encheu-se de compaixão por eles, porque eram como ovelhas sem pastor”.
Depois de ter meditado sobre o envio dos discípulos por parte de Jesus no domingo passado, hoje, além de nos relatar sobre o seu regresso, no qual eles “contaram-Lhe tudo o que tinham feito e ensinado”, a página do Evangelho nos apresenta o Mestre como um verdadeiro pastor cujo olhar para os discípulos e para a multidão é um olhar de amor e de compaixão.
“Jesus … encheu-Se de compaixão” (ἐσπλαγχνίσθη), o mesmo verbo que encontramos em Mt 9,36 “encheu-Se de compaixão”, uma chave de leitura para compreender a encarnação, a sua vinda, a vinda de Deus ao mundo. A compaixão é uma emoção profunda; envolve toda a pessoa; significa ‘cum passio’, sofrer com, sofrer juntos, portanto descreve o amor visceral que Jesus, Deus, tem pela humanidade.
É por isso que diante dos apóstolos “que nem tinham tempo para comer”, o coração do Senhor não ficou indiferente, mas, sendo grande, Ele os convida à parte – “vinde comigo para um lugar isolado e descansai um pouco” – isto é, Ele se identifica com seu cansaço.
É por isso que, mesmo que aprecia a necessidade física dos seus discípulos, diante de uma multidão “como ovelhas sem pastor”, o coração do Senhor não ficou indiferente, mas, sendo grande, Ele “começou a ensinar-lhes muitas coisas”, isto é, se curvou sobre as misérias humanas, socorrendo-a.
Eis o coração do Pastor supremo e zeloso. Ele teria preferido que os seus discípulos gozassem do devido direito ao descanso e a pausa. Em vez disso, Ele, optando-se em não passar adiante como o sacerdote e o levita do Evangelho do Bom Samaritano (cf. Lc 10,25-37), posterga o mesmo direito e começa a ensinar muitas coisas à multidão.
Ele “começou a ensinar-lhes muitas coisas”. Caríssimos, há uma vida profunda em nós que continuamos a mortificar, a fazer morrer de fome, a desidratar. Para a tal vida, Jesus se dirige, como um punhado de luz lançado no coração de cada um de nós, para nos iluminar o caminho. Ele, Pastor eterno, que se coloca à disposição, que não se poupa, que deixa os outros ditarem os planos, generoso com os sentimentos, dá algo grande à esta multidão.
Dar atenção sempre, sobretudo aos desorientados, aos que têm uma lágrima ou uma alegria para compartilhar é um ato de amor. É isso que Ele espera de nós, pastores. Não é em vão que desiludido com os pastores que perdem e dispersam as ovelhas do seu rebanho, o Senhor, por meio do profeta Jeremias (cf. Jer 23, 1-6), adverte: “vou ocupar-Me de vós e castigar-vos, pedir-vos contas das vossas más acções”.
Com efeito, os pastores relutantes, que em vez de se dedicar ao rebanho, estão empenhados em personalizar o seu ministério a partir das preferências pessoais, não podem deixar de causar dispersão e confusão, suscitando a intervenção decisiva de Deus. A propósito, o Papa Francisco afirma o seguinte: “isto vo-lo peço: sede pastores com o ‘cheiro das ovelhas’, que se sinta este… pastores no meio do seu rebanho, e pescadores de homens” (Homilia da Quinta-feira Santa, 28.03.13).
Ele “começou a ensinar-lhes muitas coisas”. Com esse gesto, o grande ensinamento aos Doze, portanto, é aprender um olhar que tenha compaixão. As palavras nascerão e as alegrias florescerão. E isso se aplica a cada um de nós: quando aprendermos a ter compaixão, quando voltarmos a nos comover, o mundo se inserirá na nossa alma e nos tornamos próximos uns dos outros, um só povo e uma nova humanidade, reconciliada e reunida num só Corpo (cf. Ef 2, 13-18).
Raoul Follereau, (jornalista, filantropo e poeta francês do século XX) grande testemunha moderna de caridade costumava dizer: “a vossa felicidade está no bem que fareis, na alegria que difundireis, no sorriso que fareis florescer, nas lágrimas que fareis enxugar”. Que o Senhor nos ajude a ser testemunhas crentes e credíveis da sua bondade e compaixão, levando alegria e verdade aos oprimidos, aos desorientados e aos deprimidos pela dor e pelo erro.
Boa meditação e um abençoado “djàgingù da tudu nancê”. JB