Rua Pe. Martinho Pinto da Rocha São Tomé, São Tomé e Príncipe

25º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO B

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Sab 2,12.17.20; Tg 3,16-4,3; Mc 9,30-37

O Filho do homem vai ser entregue… Quem quiser ser o primeiro será o servo de todos

 

Esta linguagem de Jesus, no Evangelho de hoje, é incomum e vai contracorrente.  De fato, antes disso, Ele falava sobre a sua paixão, morte e ressurreição, e “os discípulos não compreendiam aquelas palavras”, aliás, no caminho “tinham discutido uns com os outros sobre qual deles era o maior”. Pois, enquanto o Senhor falava do seu fim, eles, os seus íntimos, estavam lutando pelos poderes deste mundo…! Daí que Jesus nada pode fazer senão repreendê-los, como cada um de nós, oferecendo-lhes três definições de Si mesmo, sendo uma mais contracorrente e mais paradoxal que a outra: ser último, ser servo e ser criança.

 Caríssimos, o comportamento dos discípulos de Jesus reflete, em tudo, nas nossas atitudes, como homens e mulheres deste tempo.  Podemos dizer que, tanto na época de Jesus como hoje, era difícil entender a palavra humildade (deriva de latim humus, terra, portanto humilis, humilde, é aquele que provem da terra, está em baixo, no solo). Porque mesmo então, como hoje, o que mais importava era o exterior, a aparência, o que pensava Fulano ou Fulana, Beltrano ou Sicrano de mim, e não o que pensa Deus!!! A interioridade ou uma boa consciência pura e íntegra perante Deus não era importante – e o cúmulo, como denunciou Papa Francisco e, muito antes, os seus predecessores, é que muitos dos nossos irmãos e irmãs, hoje, vivem como se Deus não existisse (cf. Exortação ap. Evangelii Gaudium, 80). 

 E Jesus com paciência heróica, durante estes dois mil anos, continua a repetir: “quem quiser ser o primeiro será o último de todos e o servo de todo”. Uma nova lógica nos é oferecida pelo Evangelho, o serviço e a humildade como valores humanos e não como fraquezas. E numa sociedade onde existe inveja, rivalidade, desafio frenético e muita competição, por exemplo para defender o emprego, falar de humildade, ser último, ser servo é anacrónico, é como ouvir uma nota discordante que estraga a execução de uma bela melodia musical, a voz fora de coro.

 Mas, perguntemo-nos a nós mesmos, isso é realmente assim?  Não é que nós, como os discípulos de então, temos compreendido mal a importância desta mesma virtude que é fundamental para os cristãos?  “Pôs os olhos na humildade da sua serva: de hoje em diante me chamarão bem-aventurada todas as gerações” (Lc 1,48).  “Quem se exalta será humilhado, e quem se humilha será exaltado” (Lc 18,14).  Essas expressões são apenas exemplos de como a humildade é uma garantia da bondade de Deus que cuida sempre dos Seus filhos e filhas.

Portanto, segundo o Evangelho de Jesus, o primeiro só se pode ser no serviço, no dom de si, no gesto de amor.  É por isso que “tomou uma criança, colocou-a no meio”: a criança é o emblema da menoridade, da secundariedade (subalternidade, inferioridade …), da fraqueza, da entrega.  “Se não vos tornardes como crianças …” (Mt 18,3).  Jesus nos desarma e emancipa o nosso lado lúdico e infantil.  Ademais, entregar-se à infância é entregar-se ao coração, ao sorriso, à paz, aceitar de deixar a mão na do outro, abandonar-se sem reservas e em paz.  A criança nunca armaria ciladas a ninguém (cf. Sab 2,12), porque é pura, pacífica, compreensiva, generosa e cheia de misericórdia (cf. Tg 3,17).

 Daí que Jesus acrescenta: “quem receber uma destas crianças em meu nome é a Mim que recebe”!  O Senhor dá um enorme e surpreendente passo à frente, ou seja, apresenta a criança como a sua imagem.  Deus como uma criança: “e quem Me receber não Me recebe a mim, mas Àquele que Me enviou”! O paradoxo do pensamento na época de Jesus, isto é, o Rei dos reis, o Criador, o Eterno numa criança?  Etty Hillesum, escritora holandesa de origem judaica e vítima do Holocausto (1914-1943), diria: “Se Deus é como uma criança, isso significa que Ele deve ser protegido, cuidado, alimentado, ajudado, acolhido”. Portanto, a pequenez, a fragilidade, a ternura, a confiança, a franqueza e  a humildade de uma criança como proposta para o nosso caminho de fé.

Santa Teresinha do Menino Jesus, pequena como era, dizia: “Sou apenas uma criança, impotente e fraca, no entanto é a minha própria fraqueza que me dá a audácia de oferecer-me como Vítima ao Teu Amor, ó, Jesus!” (Manuscrito B-255).  Portanto, caríssimos, estamos no caminho errado, se não vivermos a humildade e não tentarmos fazê-la aumentar em nós, apesar das oposições ou contrariedades da mentalidade comum.  Recordemo-nos de que cada um de nós é como uma pérola preciosa; é um tesouro de valor inestimável; e é uma dádiva de Deus. Cada um de nós recebeu das mãos de bom Deus talentos para serem conhecidos e fazê-los dar frutos.  Que o Senhor nos dê a cada dia a consciência da nossa pequenez e a alegria de poder colocá-la ao serviço do Reino dos Céus

Boa meditação, caríssimos e “uwã santù djàgingù da tudu nancê”. JB