Rua Pe. Martinho Pinto da Rocha São Tomé, São Tomé e Príncipe

27º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO B

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Gen 2,18-24; Heb 2,9-11; Mc 10,2–16

… não separe o homem o que Deus uniu

 

A noção forjada e errada desta frase resulta no fracasso de muitos matrimónios, e causa feridas profundas e dolorosas.  Como no tempo de Jesus, ainda hoje existe a tentação de considerar o casamento apenas do ponto de vista puramente jurídico. Não! O matrimónio não é só isso, ou seja, um contrato celebrado por uma vontade humana (…), suscetível de ser dissolvido pela mesma vontade humana.  É algo muito maior do que um mero assunto de processo jurídico.  É a obra de Deus e, como tal, somos chamados a respeitá-la!  Pois, que o matrimónio é uma realidade muito mais profunda, na qual o próprio Deus está envolvido.

E a palavra de Deus, no livro de Gêneses e no Evangelho, hoje, nos confirma isto: o projeto original ou ideal de Deus (ou desígnio primordial sobre o casal humano: exortação ap. Amoris Laetitia n. 62, 19.03.2016) para o homem e a mulher é formar uma comunidade de amor, que se complementem e se correspondam – “não é bom que o homem esteja só: vou dar-lhe uma auxiliar semelhante a ele”(Gn 2,18). Deus olhou para a solidão do homem, buscou-lhe uma auxiliar que lhe correspondia. Tal auxiliar não é um animal – de fato “Deus, depois de ter formado da terra todos os animais … não encontrou uma auxiliar semelhante ao homem” (Gn 2,19-20). E nem é outro homem como ele, … porque o “Senhor … formou a mulher” (Gn 2,22).

Curiosamente, quando Deus trouxe a “auxiliar semelhante”, isto é, a mulher, o homem disse: “Esta é realmente osso dos meus ossos e carne da minha carne” (Gn 2,23). Ele poderia muito bem chamá-la de homem …, por outro lado a Escritura é clara: “chamar-se-á mulher” (Gn 2,23). E aqui se concretiza o que está escrito no Evangelho de hoje: “no princípio da criação, Deus fê-los homem e mulher”.  João Paulo II, numa das suas catequeses sobre o matrimônio na visão integral do homem, definiu o tal “princípio” como “a primeira herança de cada ser humano no mundo, homem e mulher, primeira certidão da identidade humana segundo a palavra revelada, primeira fonte da certeza da sua vocação como pessoa criada à imagem do próprio Deus” (Audiência Geral, 02.04.1980).

E assim, torna-se para nós um ensinamento onde a masculinidade e a feminilidade têm grande importância no desígnio de Deus, e ignora-lo, portanto, é ignorar o que somos diante de Deus: homem e mulher. Portanto, Deus os criou para se complementarem, ajudando, amando uns aos outros. Uma só carne “una caro” (Gen 2,24), que implica viver em plena comunhão “ele” com “ela”, doando-se, partilhando a vida reciprocamente, unidos por um amor estável e indissolúvel.

Se os fariseus do Evangelho raciocinassem dessa maneira, nem mesmo ousariam pôr à prova Jesus. Mas, “fariseus” – como diz o nome no sentido figurado, pessoas falsas e hipócritas, que ostentam o rigor moral, uma piedade, honestidade ou caridade que não possui e se preocupam apenas com as aparências externas – buscam a questão da legalidade. Jesus, por outro lado, diante da lei judaica do divórcio, reafirma o desígnio original de Deus para o homem e a mulher: “já não são dois, mas uma só carne …, não separe o homem o que Deus uniu”.  E assim elevado pelo Senhor à dignidade de sacramento, o matrimónio torna-se um pacto pelo qual o homem e a mulher são chamados a constituir entre eles um consórcio íntimo de toda a vida (cf. cân. 1055 § 1).

E aí, o Senhor, segundo projeto ideal de Deus, nos mostra um amor que supera a crise conjugal, um amor que corresponde ao perdão, um amor total: ele entrega TODO o seu ser a ela, e vice-versa; exclusivo: ele entrega todo seu ser SOMENTE a ela, e vice-versa; e definitivo: ele entrega todo seu ser somente a ela PARA SEMPRE, e vice-versa.  Somente o amor com essas três características reflete e respeita o projeto original de Deus para o homem e a mulher.

Não é um amor que prevê a “dureza dos seus corações”, tornando-se possessivo (ciumento, arrogante, egoísta, obcecado, sufocante, intrusivo, dominador) mas é um amor “no princípio da criação”, como quis Deus no seu plano, um amor oblativo, livre: “amo-te a ponto de te perder”, dizia assim um pensador. Neste amor deve estar contemplado o conceito de amor em Santo Agostinho: “ama e faz o que quiseres! Se calares, calarás com amor; se gritares, gritarás com amor; se corrigires, corrigirás com amor; se perdoares, perdoarás com amor. Se tiveres o amor enraizado em ti, nenhuma coisa senão o amor serão os teus frutos” (Homilias sobre a 1ª Epístola de João).  E assim sendo, a separação não está prevista no mesmo plano ideal de Deus.

Portanto, a novidade a ser apreendida reside antes de tudo no fato de que Jesus coloca o fundamento do matrimónio no amor que oblativo e não na lei humana passível da inconstância dos homens ou dos sentimentos instáveis ​​do coração.  Bem-aventurados os cônjuges que, à luz e força desta palavra, renovam a sua união, descendo com coragem no seu coração e ao coração do seu matrimónio para ver o que há para tirar e o que há para obter de Deus.

Boa meditação, caríssimos e “uwã santù djàgingù da tudu nancê”. JB